sábado, 25 de agosto de 2007

PG, “PARA UMA COLETA RELAÇÃO”, OU UM FANTASMA DO AMOR


Eles o viram num quiosque do calçadão de Camburi. Cumprimentando-o, chamaram-no, íntimos, de PG. Carmelo Merzzo nada entendeu; em que podia servi-los, não tomavam uma cerveja? Eles riram: “mas há muito tempo, nós quase fomos uma família, não se lembra? Eu sou Landi Phanuti, e este é meu irmão, Hidovani Phanuti”. PG se lembrou enquanto balançava a cabeça, embasbacado, mas isso fora há 20 anos, porra, como o reconheceram?
(Naquele tempo, era atlético como um soldado romano; agora, grisalho como um urso, mas, com aquela sunga branca de praia, ele ficava inconfundível para quem já o conhecera na intimidade. Nascera em Pau Grande, RJ, e essa toponímia se lhe imprimira, com méritos, nos órgãos genitais. Até Joça, o alfaiate, que o a-do-ra-va – escandia o verbo e, num êxtase à Santa Teresa, revirava os olhos –, chamava-o de PG, que, agora, era um 50tão bem casado. Sóbrio, não se lembrava de ter tido relações homoeróticas, não por falta de oportunidade, mas por excesso de macheza!)
Zonzo com aquele brusco recuo da memória no tempo, olhou o relógio e, fingindo importância profissional, pediu a conta. Caralho, hora de sair! Tinha um montão assim de serviço no escritório, andava sem tempo pra coçar o saco; agradecia por terem-no reconhecido e cumprimentado; a mãe ia bem? Deixassem aí um número de celular! Não tinham uma caneta? Tudo bem, memorizava qualquer coisa; numa horinha dessas, ligava, falou? Balangou a mão, parando o 523 e embarcando numa dupla viajem: no espaço, até ao Terminal de Laranjeiras; no tempo, até ao verão de1987.
Sua amizade com Landi Phanuti durara 12h e R$ 30, 00 (moeda atual) – débito contraído no Bar Carola, próximo da casa dela, em Itacibá. Conhecera-a numa discoteca, no Cobilândia Futebol Clube, e assim que a viu, pensou: “se eu pudesse, amá-la-ia sempre”. Tocavam Dudu França. Ali, ela dançava só; Carmelo, também. Ele a convidou para fumarem lá fora. Ela foi. Antes não fosse, disse, ele agora, passando em frente ao Motel Taiti.
Agarrara-a ali mesmo, na varanda do clube. Movidos pelo romantismo a granel que as músicas derramavam, beijavam-se, mordiam-se e roçavam-se. Nisso, um rapaz de uns 15 anos, branco, rechonchudo como um anjo barroco, dera-lhe uma tapinha no ombro. Carmelo virara-se, e Hidovani vendo-lhe a braguilha vultosa, olhou para o teto: que falta de vergonha! A mana era moça de família; com licença, iam embora; ambos deviam chegar a casa no máximo às 23h. Num ato a um tempo cúmplice e viril, Carmelo abraçou-o paternal, porém, firmemente de lado, mas, involuntáriamente, suas “coisas” tocavam a coxa esquerda do jovem. “Mas já são 22h30min e olha a chuva que começou a cair!” Iriam pra onde mesmo? Não lhes poderia oferecer uma carona, o carro tava logo ali – Carmelo apontava para um Fiat 147 TL, de cor azul.
No trajeto, silêncio. Phanuti e Hidovani o intrigavam. Quando eles chegaram a casa, uma coroa os esperava na varanda. Chovia! “Entrem, senão pegam uma gripe nesse aguaceiro. Mãe, esse é Carmelo: prazer, Nuves Phanuti”. Nossa, que paragrama!, (ele pensou). Tomassem banho já! Carmelo e Hidovani, juntos, no banheiro social; Phanuti, na suíte; tirassem logo as roupas encharcadas; “filho, vê um calção pro moço”; agradecia por lhe trazer os filhos, não ia deixá-lo sair naquele temporal; dera no rádio que tava tudo alagado em São Torquato; dormisse ali, no quarto de visitas; faria algo para que beliscassem; ah, tinha vinho na geladeira. Naquele Box de 0,90m x 1,20m, com apenas um chuveiro, anfitrião e visitante se revezaram em constrangimentos e olhares oblíquos. Carmelo, ainda meio excitado com Landi Phanuti, não se arrefecia ante Hidovani, nu, com aquela pele quase rosada... Machos, falaram sobre o Flamengo, fazendo um grande esforço pra não parecerem frescos. Foram para a mesa à luz de velas. Um raio interrompera o fornecimento de energia. Bebiam e comiam; os pés de Carmelo roçavam os de Phanuti, e aquele calção de Hidovani só fazia acentuar-lhe os dotes, quando se erguia para ir mijar.
Ele nunca soube se adormecera; intuía que fora o último a se deitar; apagara a luz, mas a porta do quarto ficara aberta; estava bêbado; fazia calor; usava apenas um calção branco. Da cama, olhava o fulgor intermitente dos relâmpagos que alumiavam, através de uma báscula, o pequeno cômodo, e ouvia os trovões que já soavam distantes. Dormira pensando em Phanuti, na simpatia sexy da mãe, Nuvens, e na pele de lírio do Hidovani, mas fantasiava isto: ou Phanuti ou Nuves entrando silenciosamente pelo quarto, fechando a porta e se deitando sobre ele.
Acordou. Puta que o pariu, que ressaca! Fazia frio; lembrou-se de que havia sonhado e gozado. Esforçava-se para reconstituir os detalhes. Procurou vestígios de porra no calção, nada; na cama, tampouco. Estava encafifado. Às 9h, o café. Era sábado, pra que a pressa, ficasse para o almoço; ”você é engenheiro? Ajude os meninos com as lições de matemática”. Namorar Phanuti, ela não deixava: a moça já era prometida a um rapaz de São Mateus, mas gostaria de tê-lo como amigo. Era viúva, livre. Iria à feira; logo tava de volta pra fazer o almoço. Carmelo dissera à Phanuti que sonhara. Fora ótimo. Ela não teria, cobrindo-se com um lençol branco da cabeça aos pés, ido de madrugada até à cama dele? “Eu”!? Até quereria, mas o irmão a vigiava constantemente do quarto ao lado do de visitas. Carmelo vestiu as roupas ainda úmidas e foi ao Bar Carola. Esquecera-se da carteira. Buscá-la-ia. “Não, o senhor paga depois; não é amigo de dona Nuves?” Tomou 3 cervejas e pediu 7 para levar. Refletia... Como chupava bem aquela boca quente e úmida sob aquele lençol branco! Gozara duas vezes...Amava, mas a quem: Linda ou Nuves Phanuti? Pensava... Ah, lembrara-se de que seu amor usava meias brancas; andara silente à noite. Voltou a casa; dona Nuves, também. O frio aumentara. Na cozinha, todos usavam tênis e meias, mas somente as de Hidovani eram brancas.
Agora, em Laranjeiras, Carmelo pensou: trabalho, casa ou praia. Para onde? Sabia que volveria àquele quiosque. E foi.

2 comentários:

arquiteliteraturas disse...

Qualquer semelhança entre relatos orais e esta narrativa será mera conseqüência.

GAZUL disse...

São Mateus, chuveiro, flamengo, quiosque, PG... bioficcionalidades, meu caro Apolus Vi(l)as Boas, mas o carro não seria um Fiat Uno Roxo?